04/12/10

Don't mess with Texas!

Preconceitos existem. Sao contra-produtivos, generalistas, conduzem a uma limitacao intelectual, fecham horizontes e eliminam aberturas de espírito. Mas o que fazer quando, a qualquer oportunidade, esses mesmos preconceitos sao confirmados?
Preconceitos sao juízos pré-concebidos sobre algo ou alguém, tendencialmente irracionais porque nao baseados num raciocínio metódico nem numa análise completa de uma certa realidade, até serem provados na íntegra e aí passam a factos científicos ou pura e simplesmente transformam-se numa verdade.
Existe um preconceito europeu (provavelmente mundial) sobre texanos, o qual temos que agradecer à Dallas, aos Georges Bush ou ao Texano Rico dos Simpsons. Seguindo um pouco a lógica do site Stupidedia (em alemao), o texano é intelectualmente modesto, muito down-to-earth no tratamento, tem tendencia para a obesidade, adora carne, charutos e descapotáveis. O texano é um cowboy, um rapaz da vaca, portanto, que se move a cavalos, Mustangs ou Hummers. Vive num rancho e aprecia gozar a sombra da sua torre de exploracao de petróleo. Alimenta um fetiche por botas e chapéus assim como piscinas  em circunstancias absurdas. Tem um orgulho evidente em ser o que é e nao lhe cai nada bem quando ouve do espaco "Houston, we have a problem!". É branco, cristao e republicano, anti-welfare state e conservador. Apoia as intervencoes militares em qualquer sítio e vocifera contra a ameaca do terrorismo, que obviamente vem de fora (Axis of Evil). Ao mesmo tempo que recusa qualquer intervencao estatal que esteja ligada à esfera privada do indivíduo, aceita piamente todas as estratégias anti-terroristas que o Estado tem vindo a impor aos seus cidadaos como acto patriótico
Estao a ver isto tudo numa só pessoa? Foi a minha breve (felizmente para a minha sanidade mental) companheira de discussao hoje à noite. Tudo comecou quando questionei o body scanning a propósito do protesto dos americanos contra esta medida (mais uma) de (pseudo)seguranca nos aeroportos que decorreu no fim-de-semana de Thanksgiving. O típico discurso fundamentalista foi imediatamente accionado numa mente condicionada a pensar assim, sem se aperceber da própria manipulacao qual cao de Pavlov: "Claro que o scanning é importante no ambito do combate ao terrorismo internacional. Aliás, sou da opiniao de que nenhum terrorista merece qualquer tipo de julgamento justo, pelo contrário, deveria ser imediatamente lancado aos leoes ou condenado à pena de morte!". Ao que respondi, reconhecidamente em tom bastante provocatório: "Se pensarmos bem nos ataques sádicos a civis no Afeganistao ou no Iraque, poderíamos classificar os soldados responsáveis como terroristas dado nao aplicarem qualquer tipo de regras subjacentes a situacoes de guerra.". O patriotismo nao se fez esperar: "I am so fucking tired of having to put up with all this shit! (literalmente) Voces europeus tem a mania de nos atirar à cara tudo o que fazemos de mal, na vossa opiniao, sem que apresentem uma solucao". Eu repliquei: "Solucao para que? De que problemas estamos a falar? Dos que agora se verificam após a invasao injustificada de um país que nao é o vosso? Agora é tarde, resolvam-no com os vossos aliados!". O tom foi ficando acesso e muito agressivo. "Ah, queres dizer que a nossa reaccao ao 9/11 deveria ter sido nula?". Nao pude deixar de sorrir porque mais uma americana pensa que a celeuma se reduz aos acontecimentos fatídicos deste dia, apagando por completo tudo o que está por detrás assim como todas as teorias de um possível envolvimento do próprio governo nos atentados, para nao mencionar o facto de o Iraque nada ter a ver com a história toda. "E tudo o que aconteceu anteriormente ao 9/11 nao conta??" A mulher estava a ficar cada vez mais enfurecida e insegura. "Perguntei-te qual a VOSSA solucao para o problema, nao me respondeste é porque nao tens alternativas!", ao que retorqui "Mas solucao para que? Qual é, na tua opiniao, o verdadeiro problema?", insistindo no exercício da dúvida e introspeccao nacional. "International terrorism!", gritou, quase como a auto-convencer-se (e eu pensava "Onde é que já ouvi isto?"). E nisto vi que estávamos num beco sem saída e parei com a troca egocentrica de argumentos porque vi que, mais uma vez, um preconceito meu se comprovou. Infelizmente. Fiquei com a impressao - lá está mais um preconceito - de que texanos gostam de ter sempre a última palavra, nem que esta seja shit. Valeu-nos a presenca conciliatória de um judeu americano que nao só mediou como tratou de eliminar o nosso conflito verbal, relatando um pouco sobre o que ele e a própria família entendem sobre comportamentos racionais.
Agora falta conhecer os outros texanos, todos eles, e teremos teoria.
E nem sequer toquei na obra arquitectónica do Assange...

Post Scriptum: Para o caso de nao ter ficado claro, a minha texana é branca, republicana, bastante conservadora e convicta crista e católica.  Ah, e fa da pena de morte.

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