01/11/10

Pobretes, mas alegretes! Será?

A minha natural condescendencia em relacao a Portugal deu origem a um fatalismo e um negativismo tao atrozes como inevitáveis. Um post encontrado Entre as brumas da memória sobre o périplo antecipado a um dos centros comerciais de identidade estrangeira na capital avivou-me as recordacoes - e foram muitas - da minha última estada no berco. Estávamos celebrando os 867 anos volvidos desde o Tratado de Zamora quando eu, sincera e literalmente a leste dos hábitos conterraneos em dias de feriado, decido ir ao cinema.  Tristemente, mais uma vez seguimos o exemplo de quem nao tem exemplos a dar-nos e decidimos integrar as salas de cinema, que nao sao mais do que prolongamentos de um bairrozinho sujo e decadente chamado Hollywood, em grandes centros de consumo compulsivo. Primeiro desafio: Encontrar um lugar no parque de estacionamento (como se já nao bastasse ter sido "obrigada" a usar o automóvel, já que a linha de comboios que liga a minha cidadezinha de província à cidade grande, capital de distrito, está paralizada há uns dois anos, dizem as boas-línguas...) . Logo aí antevi o segundo desafio: Poder deslocar-me livremente e no mínimo tempo possível até ao meu destino final, a bilheteira. Fiquei estupefacta, nao, mesmo atónita e quase afónica ao aperceber-me da quantidade de pessoas enfiadas no recinto, a passar o tempo, a passar do tempo, a comprar, a vender (pensava que nao se trabalhava nos feriados... pura ingenuidade...), a esperar, ... Em vésperas de aprovacao de um orcamento recheado de prendas pós-Natal, as medidas de austeridade muito bem embrulhadas e esmiucadas (ai sim?). Pior, numa altura em que o desemprego dispara, as situacoes de trabalho precário aumentam, a competitividade nacional diminui, os níveis de dívida pública e privada atingem máximos históricos (ainda que o crédito mal-parado nao seja tao elevado quanto esperado...). Uma total alienacao massificada. Um torpor absurdo. Ou será mesmo o expoente máximo de um capitalismo predador que tudo deturpa, nao menos o nosso sistema de valores?
Esta parece-me ser a única explicacao plausível, aliada talvez a um complexo de inferioridade, associado a uma escassez provocada de possibilidades, ainda por trabalhar desde os tempos da ditadura pela qual agora tantos suspiram (e eu por eles). Só assim se justifica o nosso padrao actual de consumo, desvairado, megalómano, demasiado acima nao só das nossas possibilidades como do que é realmente necessário. Um triunfo do supérfluo, uma verdadeira vitória do capitalismo na sua forma mais pérfida.

"... by the 20th century, a concerted effort by the business community set out to distort these notions and mold a new army of impulsive, perpetually dissatisfied, status conscious consumers. (...) the human being is groomed to perpetually want "more" material wealth, for the "more" seems to go to infinity. The result is a culture which does not have a concept of balance, or a sense of what is actually important, or "enough". (...) a classic tactic of advertising is to exploit this neurosis by using the media to depict a person with something that you do not have, making you feel as though you need to have it in order to be "equal"."

Parece que estas passagens parafraseadas directamente do manual para activistas de um movimento que ando a seguir foram inspiradas em Portugal... Mas nao.

Juntem a isto a mania das estacoes (sim, existe uma mid-season!) e das coleccoes, dos saldos e das liquidacoes totais, é ver as peregrinacoes. Nem Fátima (local que, pela primeira vez, tive o prazer incomensurável de visitar este ano) chama tantos crentes!

Como se nao bastasse, o filme a que assisti só nao foi uma desilusao redonda pois nao ia com grandes expectativas. "Quem te manda a ti, sapateiro, tocar rabecao?", diria o meu avo. O tao anunciado come-back da Julia Roberts, baseado num pedaco de literatura cor-de-rosa especialmente dedicado ao sexo feminino em crise psicológica? Pois, isso mesmo.

1 comentário:

  1. Muito bom post :) Também vi esse filme em Portugal. Oh céus, a historia de uma menina mimada que (pasmem) tem uma vida maravilhosa ao longo do filme inteiro (desde o principio ao fim) e mesmo assim farta-se de chorar e blablabla. Nao há pachorra. Tive vontade de me levantar para abanar a Julia Roberts "Olha, trocamos de vida 'tá?" ;-)

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